“Você deve estar ficando louca. Só pode”, argumentaram os familiares de Adriana Tenório assim que ficaram sabendo da corajosa decisão que a então confeiteira havia tomado. Como não é raro, a empreendedora social é mais um daqueles casos de gente que sente na pele a ausência de uma assistência e, em vez de murmurar pelos cantos, arregaça as mangas e se dispõe a resolver o problema.
“Tudo começou de um momento difícil da minha vida. Após uma separação dolorosa, me vi com os três filhos pequenos, tendo que trabalhar para sustentar a casa e sem ter onde deixar as crianças”, recorda Adriana. As forças vieram do Menino Deus. Adriana fala orgulhosa e sem um pingo de autocomiseração do dia em que percebeu que uma creche comunitária não era o bastante para estancar a hemorragia deixada pelo poder público na zona periférica do município de Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba.
Assim como ela, outras mães faziam malabarismo para se equilibrar em um dia de 24 horas e dar conta do trabalho, da renda, da casa e dos filhos. Não há tripla jornada que aguente! Uma parte do alívio, na virada do século, veio da creche comunitária Menino Deus, que abrigava as crianças no contraturno escolar. Tomada por um sentimento difícil de explicar, jogou tudo para o alto e abraçou aquelas crianças e as gerações futuras que estavam por vir.
Em 2001, com 30 crianças, nascia a Associação Menino Deus, uma ONG que atende crianças de 1 ano e seis meses a 12 anos de idade em situação risco e baixa renda. O funcionamento é diário, em tempo integral ou no contraturno escolar. Os pequenos de até cinco anos são atendidos pelo Programa de Educação Infantil. A faixa etária de 6 a 12 anos é atendida no contraturno, com reforço do currículo escolar e ainda oferta de oficinas nas áreas de dança, música e esportes. A intenção é garantir que a infância dos beneficiados seja livre do trabalho infantil, da violência, negligência, abuso ou exploração sexual e ainda promover o acesso à educação, sempre com vistas às diretrizes do Estatuto da Criança e do Adolescente.
A passagem da Menino Deus pelo Projeto Legado 2013 é parte dessa perseguição por melhorias. “Foi um momento intenso e de ritmo acelerado, pois não é fácil implantar tudo que aprendemos naquele ano. Foi um salto em quantidade e qualidade”, opina Adriana.
Na primeira edição do Projeto Legado, aprenderam sobre planejamento estratégico, comunicação e captação de recursos. De 30 crianças assistidas, saltaram para 60 em 2013 e chegaram a 246 em 2015.
Adriana entende que sua missão é transformar não apenas o futuro de uma criança, mas de toda sua família e futuras gerações. “Tem organização por aí que se orgulha de dizer que atendeu a filha, a mãe e a vó! Eu acho isso um fracasso. Não posso aceitar essa condição. Meu trabalho não faz sentido se eu não mudar a realidade dessa pessoa. O nosso papel é dar uma condição para que os filhos dos nossos alunos não precisem estar aqui”.
Texto: Ester Athanásio