“Tudo começou quando minha filha Beatriz, com um ano e meio sofreu alterações comportamentais graves, mudando tudo que estava se construindo até então. A partir daí iniciamos uma luta frenética para ajudar nossa filha a se desenvolver e por quase quatro longos anos procurei vários médicos que pudessem fazer um diagnóstico e com isso direcionar uma intervenção adequada. Nessa trajetória encontrei muitas mães vivendo a mesma angústia e desespero, sem encontrar um diagnóstico precoce e intervenção qualificada. Resolvi que precisava fazer algo em prol destas crianças com autismo e suas mães que tanto precisam de ajuda”.
Este depoimento é da fundadora e presidente da AAMPARA, Rosimeire Benites, que com muita garra e determinação fundou uma instituição em prol das pessoas com autismo e de suas famílias. Em síntese, o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) é um transtorno do desenvolvimento neuropsicomotor, que abrange dois grandes domínios: um que diz respeito às deficiências sociais e de comunicação e outro interesses restritos e fixos intensos além dos comportamentos repetitivos.
Hoje a incidência frente as pessoas como TEA gira em torno de 1% da população segundo o DSM-V. Aparentemente pouco, mas esse número no total da população de Curitiba chega a 18 mil pessoas, das quais somente 10% possuem diagnóstico preciso e confiável, os outros 90% das famílias vagam sem ter apoio ou condições de entender o que acontece com os próprios filhos.
A AAMPARA, fundada em 2006, tem como visão “Desenvolver o potencial pleno da pessoa com Transtorno do Espectro do Autismo, conscientizando suas famílias e a sociedade de sua realidade.” E tem como missão “Acolher, apoiar e integrar a pessoa com autismo, por meio do fortalecimento de vínculos e envolvimento de seus familiares, trabalhando pela inclusão consciente na sociedade”. Hoje atendemos diretamente 25 famílias de pessoas com TEA na unidade Centro e outras 17 famílias na unidade Sabará. Todos esses atendimentos são gratuitos para as famílias.
No decorrer dos trabalhos realizados percebemos a necessidade de um apoio especifico às famílias e principalmente às mães, que na sua maioria são as cuidadoras diretas dos filhos autistas e estão convivendo constantemente com grandes dificuldades como o aumento da carga de trabalho, maiores níveis de estresse, etc.
De acordo com um estudo feito com famílias norte americanas, mães que compartilham o seu dia a dia com filhos autistas tem níveis de estresse elevados, chegando a ser comparados com o estresse crônico de soldados combatentes. Segundo o estudo publicado no Journal of Autism and Developmental Disorders, as mães que convivem com o autismo dos filhos tem aproximadamente duas horas a mais de cuidados com as crianças do que mães que não convivem com o transtorno.
Foi ainda verificado neste estudo que mães com filhos autistas, apresentam duas vezes mais chances de estarem cansadas e três vezes mais probabilidades de terem crises de estresse, sem contar outros itens que podem ser afetados a longo prazo mais que não entraram nos estudos
Ao longo do dia, elas também apresentaram duas vezes mais probabilidade de estarem cansadas e três vezes mais chances de passarem por um evento estressante. Segundo os responsáveis pelo estudo, é desconhecido o efeito em longo prazo sobre a saúde física dessas mães, já que o elevado estresse pode afetar o nível de glicose, o funcionamento do sistema imunológico e a atividade mental.
E foi pensando no tempo em que essas mães permaneciam na “sala de espera” da instituição, que surgiu a ideia de criar um grupo para elas. Grupo este em que as mães podem conversar, expor seus anseios, angústias, dificuldades, compartilhar vitórias, se espelhar em estratégias que deram certo e falar de suas conquistas enquanto mães de autistas. Um espaço aberto e democrático que é voltado para elas, onde o foco está nelas.
Surgiu com isso tudo, juntos às mães, AAMPARA, Badu Design e o Projeto Legado, o ENTRELACÊ! O projeto ENTRELACÊ nasceu de uma parceria da AAMPARA com a Badu Design, dentro do Projeto LEGADO, que apoiou e capacitou durante o ano de 2016 ambas as instituições. A Badu Design que tem um histórico de trabalho com o empoderamento feminino e geração de renda para mulheres. Unimos o útil ao agradável e hoje 25 mães fazem parte do projeto ENTRELACÊ, que produz acessórios de moda e que estão se preparando para as novas coleções. Com dois pontos de vendas fixos as mães estão se tornando empreendedoras e ainda auxiliando a AAMPARA a crescer.
Imagine você, as mães de pessoas com autismo que enfrentam inúmeras dificuldades diariamente se tornando empreendedoras, sendo cada vez mais protagonistas das suas histórias, fazendo a diferença nas suas vidas e na vida outras pessoas, aumentando sua qualidade devida e a das pessoas próximas a ela. Mulheres produzindo material que estampa as suas histórias e principalmente a sua trajetória.
Trabalhamos para dar visibilidade à realidade dos autistas, suas mães e familiares, das dificuldades e de como conseguimos auxiliar uma pequena parte destas pessoas e temos certeza que ainda há muito trabalho pela frente, muitos autistas que precisam do nosso olhar, desse olhar diferenciado e que, à partir disso podemos construir juntos um melhor futuro.
Willyan Maffezzolli, psicólogo da AAMPARA, organização capacitada pelo Projeto Legado 2016 e finalista do Prêmio Cereja do Bolo.